quarta-feira, junho 06, 2007

Desde que a turma não falte toda

Era uma vez uma turma de 40 alunos, faltaram 15, e a professora pensou está tudo bem, se faltassem os 40 é que havia algo de errado.

Era uma uma vez um indivíduo que comprou um par de sapatilhas e no entanto quando chegou a casa faltava uma e pensou, "não há problema se faltassem as duas é que era grave".

Era uma vez um indivíduo a quem faltava 40% do cérebro, mas ele pensou "nhe nhe nhe", ou seja achou que estava tudo bem desde que não faltasse o cerébro todo.

Era uma vez um governo que fez questão de alertar para o facto de não haver greve geral...

Portanto desde que não haja descalabro está tudo bem, o todo não é importante desde que estejamos satisfeitos com a parte, pode faltar uma sapatilha, 15 alunos, 40% do cérebro ou 1,4 milhões de trabalhadores (segundo A CGTP). O governo mobilizou-se de forma árdua para que toda a gente soubesse que não se tratava de uma greve geral, isto é claramente um duro golpe nos críticos do governo visto que de facto este tem uma excelente capacidade de mobilização e actuação. De facto se virmos bem toda a política socialista é bastante coerente, repare-se que também os 20% por cento de pobres portugueses também não são motivo de preocupação.

Isto remete-nos para o papel da democracia, afinal a democracia tem vencedores e vencidos, o que fica para os vencidos? A que ponto são relevantes as minorias? Será que todas as minorias são iguais perante a democracia? Desprezáveis?

Se repararmos existe um discurso bastante perverso na política e que reflecte os grandes problemas das sociedades ocidentais, bastou o governo introduzir no léxico noticioso as singelas palavras "não houve greve geral" e o país subitamente ficou mais feliz. O governo não precisou de dizer desprezem a minoria que está descontente com a sua situação laboral, apenas precisou de lembrar ao público que se trata de uma minoria, "nós já sabemos" que uma minoria é desprezável. No fundo é isto mesmo, é dar ao público algo fácil de identificar, é geral ou não é geral?...não é...então despreze-se. A própria política é assim, se há maioria no parlamento a democracia começa a parecer uma formalidade aborrecida.
É essencial garantir o mínimo que satisfaça maioria, é preciso tratar bem as minorias que jogam com as maiorias e garantir também que a maioria não se condoa com as minorias. É o mínimo consenso possível que permite perpetuar a injustiça, a democracia é jogada de forma cínica, científica, no sentido de garantir uma classe média satisfeita e manter os atropelos na clandestinidade.

Convém relembrar que a democracia surge em oposição a regimes autoritários no sentido de alargar o bem estar e os direitos individuais, tendo isto em conta não me parece suficiente democrático ter uma maioria satisfeita negligenciado as minorias insatisfeitas.


1 comentário:

pedro disse...

É o país dos remediados, das satisfações remendadas e do vai-se fazendo. Mesmo que não se faça tudo, que se faça um pouqinho...