segunda-feira, janeiro 15, 2007

Sim porque não

Agora que nos aproximamos do referendo a campanha torna-se bastante elucidativa e nenhuma tem sido tão elucidativa como a do NÃO, isto porque a campanha do NÃO tem feito mais pelo SIM do que alguma vez o próprio possa conseguir (estou a ser injusto para com os movimentos pelo sim, mas quis frisar a imensa estupidez com esta hipérbole). A aviltante estupidez que brota dos argumentos panfletários das campanhas a favor do NÃO leva o mais distraído a suspeitar que o SIM deve ser a opção certa, eu sei, a estupidez é extremamente atractiva e os portugueses também nutrem algum carinho por essa bela forma de estar na vida, mas em exagero pode dar overdose e pode raiar a luz da razão e da sensatez nas mentes mais escuras deste terraço de pategos.
Obviamente podemos estar tristes porque se a campanha do NÃO dá um belo impulso à do SIM por outro diminui e estrangula, de forma significativa, as hipóteses de uma discussão séria, racional e científica.
Mas aquilo que posso dizer é que este é um tema sério demais para ter na "oposição" um amontoado de crentes que pouco mais sabe fazer do que ser mais ovelha do que o comum mortal já é.
Assim somos confrontados com argumentos económicos que apelam ao sentimento mais mesquinho do português, fetos falantes e quiçá capazes de escrever um ensaio sobre a questão existencialista, mulheres terroristas a abortar em Portugal...e uma data de coisas que só mesmo mentes retorcidas são capazes de elaborar.
Nem sequer me vou debruçar sobre a questão de fetos falantes e sobre essas "terroristas" que para aí andam, talvez o argumento mais perigoso resida mesmo no económico, isto porque o tuga em virtude de ser mesquinho acaba por ser mais pobre...a todos os níveis. Ora iremos ter um acréscimo de despesas na saúde para subsidiar os abortos, parece ser este o grande trunfo vindo de elementos que se pautam por critérios meramente espirituais e desfasados da matéria vil e conspurcadora...só aí já começa a ser interessante. Mais interessante é que :

1. O aborto clandestino é muito mais caro que o aborto legal, isto porque aqueles que o executam num regime de clandestinidade cobram elevados preços em virtude dos riscos que correm, ou pura e simplesmente porque a mulher está numa situação vulnerável e mais predisposta a exploração.

2. O aborto só sairá mais caro para aqueles que nunca o executarem, logo o argumento de este ser um mecanismo caro é claramente um apelo à não solidariedade dos portugueses, que não contribuam nas despesas de saúde num esforço colectivo.

3. Que crentes também recorrem a esta opção.

4. Que sai efectivamente mais barato enquadrar o aborto no SNS, isto porque ao o fazer estamos a diminuir drasticamente as complicações pós aborto que a mulher terá e que entrariam nas despesas do SNS, além disso existiria um quadro pedagógico em que a mulher seria aconselhada nos métodos e em mecanismos eficazes de planeamento familiar.

5. Que os movimentos do NÃO ao estarem a recorrer a este argumento estão a recorrer à mentira que parece ser algo altamente condenável na moral católica...

Mas esquecendo estes argumentos mesquinhos pensemos no porquê da despenalização até ás 10 semanas:

. A liberdade da mulher prevalece sobre a possibilidade de um feto vir a ser uma pessoa.

. A vida é um conceito híbrido de ciência e filosofia, assim dizemos que a a planta é um ser vivo mas não condenamos alguém que pise esse amontoado de células sem capacidade de processar informação ou sentir dor. O animal é um ser vivo, não prendemos os carnívoros...a vida é vida, agora o que se discute aqui é o que a vida é para nós e isso não engloba discussões que utilizem um referencial externo ao Homem (deus) como argumento.

. A aceitação deste código penal implica que aceitamos a prisão de mulheres que voluntariamente interrompam a sua gravidez antes das dez semanas.

. Não aceitamos que em “conflito de interesses” se sujeite um ser com vontade, sensibilidade e sentimentos a um feto incapaz de discernir o quer que seja. Caso contrário levamos os camarões a parlamento para discutir as questões da pesca.

. Ser a favor do SIM não é ser a favor do aborto, é ser a favor das mulheres, da liberdade, do ser humano enquanto ser pensante.


Caso o leitor ainda esteja confuso estou certo que os vídeos seguintes elucidarão sobre a questão...








6 comentários:

arwen disse...

Antes de mais, quero dar os parabens pelo excelente post que pos, sem duvida alguem que realmente compreende a questão do referendo - LIBERDADE. Só tenho uma coisa a acrescentar, as associações do nao, como a ADAV, andam a fazer sessões de esclarecimento, agora questiono-me como é que alguem que é contra a despenalização do aborto faz sessoes de esclarecimento já que nao têm conhecimento de causa, nunca passaram por uma situação em que tem que tomar uma opção? já estou a imaginar o esclarecimento, será tao simples como isto: " votem não!"

João Dias disse...

Obrigado...arwen.
Fui investigar algumas coisas sobre essa associação ADAV e deixo-te um excerto daquilo que encontrei na ADAV de Viseu:

"- Afinal o aborto está já despenalizado em Portugal! E são muitas já as situações em que tal acontece e nem por isso deixa de haver pessoas a optarem pela morte dos filhos gerados em si e a de si precisarem para serem pessoas!

- A maioria das mulheres que abortam, fazem-no para lá das dez semanas!

- A despenalização gerará liberalização mas só até ás 10 semanas! Quem abortar às 11 semanas (p ex.) ou o fizer no “vão de escada” ou recorrer a clínicas não autorizadas, terão que ser julgadas e sofrer a pena!

- A pena para a mulher que aborte é a mesma que é atribuída a quem agredir outra com uma bofetada! (CF Código Penal e… pasme-se!);

- As mulheres que, com a actual lei, não recorrem a ela por terem vergonha ou querendo esconder um acto de algum modo condenável (infidelidade, sexo ocasional, conveniências em viver prazer momentânio…) continuarão a proceder de igual modo.

- Sabendo que a gravidez não é um estado de doença mas sim um estado sublime de saúde, não se entende a razão para incentivar o aborto!

- O aborto por opção simples da mulher é também a a destituição da paternidade."


ADAV-Viseu

Pelo menos deste excerto existe mais desinformação do que informação, inclusive algumas mentiras, por exemplo podes verificar neste estudo da APF que 72,7% das mulheres abortam antes das 10 semanas (página 17). Este estudo baseia-se em entrevistas, mas concerteza é um estudo bem mais preocupado e sério do que afirmar por alto e sem qualquer conhecimento de causa que "A maioria das mulheres que abortam, fazem-no para lá das dez semanas!"

Macambúzia Jubilosa disse...

Ia dizer que o autor dos videos era tendencioso (assim a tender para o nosso lado), pois pareceu-me que o boneco de neve do "Sim" era mais entusiasta e efusivo que o do "não", mas lá foi a minha teoria por água abaixo quando vi que o video do "não" tem mais 1 segundo que o do "sim". Ou seja teve mais tempo de antena (oportunidade de dar mais "viranços horizontais" de cabeça). Muito pouco democrático...Tss tss...

É certo que todos podem ter uma opinião e manifesta-la, independentemente de terem passado ou não pela situação. O que as distingue é a fundamentação e a consistência (e também a coerência). O que me indigna são os argumentos rasteiros, mesquinhos, obscurantistas, medievais, deturpadores e perversamente chantagistas utilizados pela campanha do "não" e que em nada contribuem para uma discussão honesta e esclarecedora.
Mas é um facto que, duma forma, também ela perversa, esses mesmos argumentos podem fazer mais campanha pelo "Sim" do que pela do "Não". Pelo menos, assim, espero (ou posso ser apenas eu que sou uma lírica).

Penso, no entanto, que a campanha do Não até defende a opção. Entre estas duas:
- não abortar
- abortar clandestinamente


PS: re-welcome back :)

Rui Maio disse...

E eis que após uns meses de ausência, o "maestro" volta à actividade (não, não estou a falar do Rui Costa mas de ti, João que embora não simpatizes muito com o meu benfiquismo, podes sempre ser comparado ao nº10, ainda por cima sendo um jogador que já deu tanto ao futebol, tal como tu já deste a este blog e quiçá à blogosfera)... e que actividade!
Com um post destes, agora tens que manter o nível (habituas-nos mal! e depois nós exigimos)...
Enfim, o que é que se pode dizer mais destes casos de "acefalia galopante"... Os da ADAV então (vou fazer aqui um apelo aos preconceitos regionais) basta dizer que são de Viseu, local pitoresco onde os homossexuais sofrem perseguições nocturnas e outras actividades igualmente recreativas!
Para concluir, espero que o resultado do referendo não nos obrigue a esperar mais dez anos e que mantenhas um nível de actividade bloguística mais constante!
P.S. - se eu não te conhecesse, diria que andaste este tempo sem postar para agora poderes regressar em grande (o que nos remetia para a questão do protagonismo) :D

botadeelastico disse...

Reitero a opinião generalizada do texto bem urdido que escreveste! Claro e em ponto rebulado!
No outro dia deparei comigo a pensar, conhecida a posição da Igreja Católica em relação ao aborto - pena de morte ao eventual ser humano e terrorismo -, nunca me apercebi da posição da ICAR no que respeita à própria pena de morte por crimes tão hediondos como o homicídio (EUA) ou tráfico de droga (Singapura) por exemplo!

João Dias disse...

MJ:
Caso não tenhas reparado estes vídeos não são fidedignos, dado que a mesma "pessoa" demonstra opiniões contraditórias. Provavelmente é um indivíduo doente mental, o que é bastante plausível dado que tem um nariz cor-de-laranja e um sorriso que forma uma semi-circunferência.

Rui:
Estou enternecido com as tuas palavras, mas não penses que o patrão dá folga...o patrão pode coçá-los, toda a gente sabe isso. Estou aqui apenas para administrar as capacidades dos outros (tu) e falar mal de tudo o que não seja feito por mim...quando eu próprio me confrontar com a minha incompetência faço uma OPA à concorrência. Que é uma coisa bonita mas que serve principalmente para aniquilar a concorrência que é melhor que eu.

Botadeelastico:
Repara que a igreja tem uma posição clara. É preciso deixar nascer, para depois poder ter um ser adulto e pronto para ser executado, é uma desfaçatez de todo o tamanho inviabilizar um ser humano que depois pode sentir e explorar toda a dor imaginável neste mundo.
Acho que a igreja em geral tem uma posição sensata, um feto não pode sentir toda a dor imaginável deste mundo, deixem-no experimentar...a igreja até sabe uns truques fixes.